Doenças Periodontais

Etiologia

As doenças periodontais são infecções do periodonto de etiologia bacteriana. Desde os estudos fundamentais de Löe et al. há trinta anos, sabe-se que a acumulação de bactérias ao nível da margem gengival produz sempre uma reacção inflamação denominada de gengivite. A presença de bactérias ao nível supra e sub-gengival é um factor constante na grande maioria dos indivíduos, que não deve ser considerada como patológica. É possível manter uma placa bacteriana suficientemente reduzida de modo a não originar uma reacção de defesa por parte da gengiva, clinicamente detectável. O número de espécies bacterianas que podemos encontrar nestas situações é muito elevado, incluindo a presença de cocos Gram-positivos, Actinomyces e bacilos. No entanto, se for permitido um aumento da massa bacteriana supra-gengival por défice de higiene oral, surgem alterações da sua composição, de tal forma que a placa torna-se Gram-negativa, anaeróbia, aumentando o número de Actinomyces e Streptococus, e surgem espiroquetas, vibriões e filamentos.


Gengivite
Fig.1. Gengivite
A alteração progressiva da massa e da composição da placa bacteriana ocorre em poucos dias, mas afecta muito significativamente os componentes do compartimento coronal. O tecido de conexão da gengiva é progressivamente destruído, e o seu lugar é ocupado por um infiltrado inflamatório. O epitélio de união sofre também alterações morfológicas importantes, mas mantém-se unido à superfície do esmalte. As fibras gengivais são parcialmente destruídas, mas o seu limite apical conserva-se ainda íntegro.Todas estas alterações caracterizam a gengivite.



Periodontite
Fig.2. Periodontite
Uma vez estabelecida a gengivite, pode manter-se como tal durante uns dias, meses ou anos. Se não for tratada, com a eliminação bacteriana, a gengivite não cura espontâneamente. Se for tratada, a sintomatologia desaparece e restabelecem-se as condições que existiam antes da doença sem sequelas. No entanto, na maioria dos indivíduos, em muitos pontos do periodonto a gengivite transforma-se em periodontite, quando o infiltrado inflamatório gengival ultrapassa a barreira defensiva formada pelas fibras gengivais. A razão pela qual sucede, e quando sucede não pode ser determinada, mas podemos suspeitar de várias razões:

  • Aumento da virulência bacteriana;
  • Diminuição das defesas do hospedeiro;
  • Destruição mecânica, intencional ou não, ao nível da união dento-gengival (invasão do espaço biológico).
Fig.3. Evolução da Periodontite
                                      


Etiopatogenia
Em qualquer caso, é necessário que espécies bacterianas suficientemente virulentas sejam capazes de manter a sua agressividade e suplantar de forma consistente os mecanismos de defesa do indivíduo afectado. Neste contexto, ocorre a difusão de diferentes produtos bacterianos que, a partir do próprio periodonto ou através do epitélio de união e mais tarde do epitélio da bolsa periodontal, levam a cabo um trabalho sistemático de destruição do suporte periodontal. O compartimento apical recebe colagenase, endotoxinas, factores inibidores da migração dos leucócitos, leucotoxinas, factores que provocam a destruição do osso, com origem em diferentes espécies bacterianas, sobretudo Porphyromonas gingivalis, Tannerella forsythensis e Actinobacillus actinomycetemcomitans. Não significa necessariamente que estas espécies sejam as etiológicas, mas sim provavelmente os maiores responsáveis etiológicos em determinados tipos de periodontite, especialmente a periodontite agressiva.
É evidente que, salvo raras excepções, o hospedeiro tenta contrariar e neutralizar a agressão bacteriana. Neste momento, é importante ter em conta que o que sucede a nível do periodonto em consequência da acumulação e actividade bacteriana pode também ser interpretado como uma reacção imune que envolve os sistemas celular e humoral. A presença de periodontites muito graves em doentes com alteração dos mecanismos de resposta imune, tal como os doentes VIH, são uma boa demonstração deste facto. Em qualquer caso, os mecanismos de defesa que o hospedeiro desencadeia a nível local não são sempre protectores, mas podem também explicar parte da destruição da matriz extracelular (colagénio) do periodonto.


Os Limites da Bolsa Periodontal
Uma vez existindo a extensão do infiltrado inflamatório ao compartimento apical ou periodonto de suporte, ocorrem algumas alterações fundamentais. A mais importante, porque é a que caracteriza a periodontite, é o abandono por parte do epitélio de união da zona da LAC e sua migração em direcção apical. Ou seja, o epitélio de união adere à raíz, ao ocorrer a esse nível a destruição do ligamento periodontal. Também ocorre a destruição do osso alveolar, de tal forma que esse espaço é ocupado pelo tecido mole gengival inflamado, que constitui a parte interna da parede mole do que se denomina como bolsa periodontal, cujos limites são portanto a margem gengival e o epitélio de união. A parede mole da bolsa é constituída por uma porção interna formada pelo aprofundamento patológico do suco gengival ao deslocar-se em direcção apical o epitélio de união e por uma porção externa formada pelo epitélio queratinizado da gengiva; não obstante, se a destruição óssea for apical à linha muco-gengival, é também formada pela mucosa alveolar. A parede dura da bolsa periodontal, por seu lado, é formada pela superfície do dente.
Neste momento se for tratada a periodontite, eliminando a infecção, o avanço da doença é detido, mas não se recupera o suporte perdido durante o período em que a periodontite estava activa.


Outros Factores Etiológicos
Para que tenha início a doença periodontal, é necessário que existam bactérias. A maturação da placa leva à formação de cálculo, que é um material calcificado que se adere à superfície dentária e sendo considerado um factor etiológico indirecto da doença periodontal, devido sobretudo à possibilidade de colonização de bactérias viáveis na sua superfície externa. Este facto, e não a existência do cálculo por si só, é o motivo pelo qual o tratamento da infecção periodontal exige a sua remoção. existem outros factores locais e sistémicos que, embora também não sejam responsáveis directos pelo início da doença periodontal, modificam a resposta dos tecidos periodontais face à presença da placa bacteriana e portanto devem ser tidos em conta.


Factores Locais
Fig.4. Alguns pacientes tem uma expressão de cálculo muito acentuado
Devem incluir-se especialmente os factores que surgem em consequência de tratamentos dentários incorrectos, incluindo margens protésicas inadequadamente ajustadas e situadas, até restos de cemento esquecidos em localização sub-gengival, ou coroas e restaurações que invadem os espaços interproximais, ou seja, tudo aquilo que, por estar situado estrategicamente ao nível dento-gengival, constitua um factor irritativo, favorece a acumulação de cálculo e dificulta a sua eliminação.
A oclusão pode ser outro co-factor nos casos onde, num mesmo dente, existe simultaneamente periodontite activa e trauma oclusal. Nestes casos a perda de suporte pode ser acelerada e podem surgir lesões ósseas verticais. As más oclusões, por outro lado, não causam gengivite nem periodontite, excepto em alguns casos de sobremordida grave por traumatismo directo do bordo incisal sobre o sulco gengival dos incisivos superiores, na sua face palatina. Em consequência, não existe geralmente justificação para o tratamento ortodôntico com o objectivo de prevenir o aparecimento de doença periodontal.
O tabaco é um factor etiológico decisivo que afecta de forma muito significativa a evolução da periodontite. Tem uma acção local sobre a vascularização gengival, para além de provocar efeitos tóxicos directos sobre os tecidos. Afecta os mecanismos defensivos do hospedeiro, acelera a destruição óssea, aumenta o risco de retracção gengival, especialmente em doentes com periodontite de evolução rápida.


Factores Sistémicos
Diferentes doenças e factores sistémicos actuam também indirectamente ao nível do periodonto, reduzindo as defesas do hospedeiro ou aumentando a virulência bacteriana, sendo descritos mais adiante.
Em consequência, as periodontites são infecções provocadas por bactérias de agressividade variável, no entanto a sua expressão clínica depende também de factores ligados ao hospedeiro e ao meio ambiente.


Bilbliografia
1. Löe H, Theilade E, Jensen SB. Experimental gingivis in man. Journal of Periodontology 1965; 36:177-187;
2. Breckx M. Histofisiología e histopatologia de la encía. Periodoncia 1933; 3:168-175;
3. Echeverría Garcia J.J., Echeverría Manau A. Manual de Periodontia. Ergon 2007; 16-23